terça-feira, 13 de novembro de 2012

ARTIGO: A profunda dívida da sociedade com as mulheres


Aline Corrêa

O ano de 2012 teve significativa relevância para a luta feminina pela ampliação de sua participação nos espaços de poder, oportunidade em que comemoramos os 80 anos do estabelecimento do direito de voto da mulher.

Uma das questões centrais da luta pela ampliação da presença das mulheres nos espaços de decisão política é a tomada de consciência de que a representação feminina é elemento crucial para a defesa dos interesses das mulheres na elaboração das políticas públicas que afetam todos os cidadãos.

Nossa sociedade tem uma profunda dívida com as mulheres, seja pelos séculos de patriarcalismo, pela discriminação em muitos domínios da vida social, como também pela escassa atenção dedicada ao firme propósito de ampliar a representação feminina nos espaços de poder.

Como é sabido, o direito de voto da mulher foi estabelecido pelo Código Eleitoral, promulgado em 1932, no contexto das transformações políticas, sociais e econômicas desencadeadas pela Revolução de 1930.

Sabemos também que, entre 1932 e 1965, o voto era obrigatório apenas para as mulheres que exerciam “função pública” ou “profissão lucrativa”. Ademais, em função da proibição do voto do analfabeto, que vigorou na maior parte do período Republicano, em 1960, por exemplo, apenas 22,18% da população estavam habilitados ao exercício do direito de voto, número que só ultrapassou os 50% da população em 1985.

Nosso passado se caracteriza pelo papel subordinado que a mulher assumiu na estrutura social patriarcal. Vinculada às lides domésticas (portanto, ao trabalho manual desvalorizado), sob a sujeição inquestionada diante do pai e, na vida adulta, do esposo, na maior parte da história brasileira as mulheres encontraram pouquíssimas oportunidades de afirmação de sua autonomia social e profissional fora do espaço privado do lar. Em muitos casos, o acesso da mulher ao mercado de trabalho se fez por absoluta necessidade de reforçar o orçamento doméstico, em face da precariedade das remunerações de todos os membros da família, inclusive as crianças.

Esses fatores apontam para as grandes dificuldades históricas enfrentadas pelas mulheres para ampliar a participação da cidadania organizada na definição da agenda das políticas estatais. Significa dizer que a comemoração dos 80 anos do estabelecimento do direito de voto das mulheres sinaliza para a complexidade e a longevidade da luta em prol da participação igualitária da mulher na definição coletiva dos destinos da sociedade. Afinal, não basta que a democracia seja participativa. É preciso que seja, também e principalmente, representativa.

Há muito ainda a ser conquistado. Sabemos que é crescente a posição da mulher como chefe de família, o que tem acarretado o acúmulo das atividades domésticas e profissionais. Nessa situação, quando da elaboração das políticas habitacionais, é importante que o poder público esteja atento a esse fato, de forma que seja assegurada às mulheres a escritura do imóvel bem como as condições de financiamento compatíveis com o salário recebido.

O mesmo pode ser dito a respeito da política educacional, especialmente no que se refere à criação de creches e pré-escolas que permitam o engajamento da mulher em atividades profissionais fora do lar. É fundamental para a mulher que deseja exercer atividade profissional ter a tranquilidade de saber que seus filhos estão sendo assistidos em creches ou escolas públicas em número e qualidade adequados.

Apesar dos esforços notáveis da bancada feminina no Congresso Nacional, sabemos que, nas deliberações coletivas, o número de vozes a defender determinada posição é condição necessária para o seu êxito em determinada votação. Por essa razão, não devemos medir esforços para lutar pela ampliação do número de mulheres candidatas e pelo maior empenho dos partidos políticos na sustentação e apoio a essas candidaturas.

Nesse sentido, também precisamos estar atentos ao cumprimento, por parte dos partidos políticos, da cota de 30% de candidaturas femininas na relação dos postulantes em eleições proporcionais - nas esferas federal, estadual e municipal. Acredito que a ampliação da participação feminina começa no âmbito partidário e, especialmente, no envolvimento direto nas campanhas eleitorais, inclusive como candidatas.

Nesse sentido, uma informação auspiciosa para o futuro tem sido a constatação do aumento significativo do número de candidatas e de vereadoras no país, registrado nas eleições deste ano. Em 2012, tivemos 285.180 candidatos a vereador do sexo masculino, o que corresponde a 68,09% do total; em contrapartida, 133.610 candidatas do sexo feminino concorreram à vereança nessas eleições, o equivalente a 31,91% do total. Quanto ao número total de vereadores no país, 7.636 mulheres assumirão uma vaga no Poder Legislativo Municipal em 2013, o que corresponde a 13,35% do total de 57.204 vereadores do país.

Como sabemos que muitas carreiras políticas começam com o exercício do cargo de vereador, é significativa esta sensação de que as mulheres estejam crescentemente envolvidas com os problemas de suas cidades. Somente desta maneira conseguirão intervir em questões e problemas que afetam a vida da comunidade onde vivem.

Em síntese, se os 80 anos da conquista do direito de voto das mulheres merece ser comemorado, a data também sinaliza para a importância da luta contínua em prol dos direitos das mulheres em nossa sociedade, luta essa que passa pela militância feminista nos espaços de representação política.

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